sexta-feira, 6 de maio de 2016

Os filhos se queixam? Todos. Faz parte do programa. Eles reclamam que a mãe pega no pé, que é onipresente, que não dá folga





Arte de Rob Hefferan


CORDÃO UMBILICAL

As mães não são mais as mesmas. Foi-se a época em que dedicavam 100% do seu tempo e do seu pensa­mento às crianças: hoje preocupam-se com seu trabalho, com sua aparência, com sua vida afetiva, e também com os filhos. O amor é o mesmo, mas aliviou-se o grude. 
 Tempos modernos. 
 
Antes todo mundo ficava embaixo do mesmo teto, ou da mesma árvore no quintal. Ninguém saía da quadra onde morava, e os olhos maternos funcionavam como pardais eletrônicos. Nada escapava. 
 
Hoje escapam todos. As mães saem para um lado e os filhos para outro. Elas vão para o escritório, para o shopping, o ateliê, o restaurante. Eles vão para aulas de natação, colégio, casas de amigos, cinemas. Mães e filhos mal se vêem, mesmo morando juntos. No entanto. uma coisa os manterá eternamente ligados, substituindo o cordão um­bilical: o telefone. 

A Embratel tem muito a agradecer às mães, pois elas praticamente sustentam o serviço. Mães ligam todos os dias para seus filhos, incluindo finais de semana e feriados. Não há um único dia em que elas não tenham algo para nos lembrar. 

Filho, não esqueça de buscar o laptop na casa do seu irmão. Filha, não esqueça de ligar para tia Antônia para agradecer o presente. Filho, não esqueça da sua si­nusite, marque uma hora no médico. Filha, não esqueça de me trazer o livro assim que terminar. Filho, não es­queça de usar camisinha. Filha, não esqueça de cortar o cabelo, sua franja está no nariz. Filho, não esqueça do que aconteceu com o deputado, manere no cigarro. Fi­lha, não esqueça do que aconteceu com a Suzaninha, olho no teu marido. 

Mães ligam no sábado para convidar para o almo­ço. Mães ligam no domingo para saber se a lasanha não estava muito salgada. Mães ligam na segunda para dizer que já estão com saudades. Mães ligam na terça agrade­cendo a gente ter passado lá. Mães ligam na quarta para comentar a novela. Mães ligam na quinta para avisar que vão a um vernissage. Mães ligam na sexta para falar mal dos quadros. Mães ligam no sábado para recomeçar. 

Os filhos se queixam? Todos. Faz parte do progra­ma. Eles reclamam que a mãe pega no pé, que é onipre­sente, que não dá folga, mas se ela fica 24 horas sem dar sinal de vida, eles chamam os bombeiros, a brigada, o Ecco Salva: descubram onde está mamãe! 

Eu falo com a minha mãe dia sim, outro também. Se ela não liga, eu ligo. O assunto? Trivial requentado, e está ótimo assim. Mãe pode fazer papel de padre, de psi­quiatra, de irmã, de filha, mas se sai bem mesmo é no papel de mãe, atenta e presente, mesmo quando longe. Trabalhem, caríssimas mães, festejem, viajem, namorem, estudem, caminhem, divirtam-se. Maternidade não é tudo. Mas continuem ligando para saber se a gente chegou bem em casa.

Martha Medeiros - Maio de 1998

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