domingo, 12 de outubro de 2014

entre o saber e o agir há uma grande diferença



Arte de Olga Marciano

"- Sabe a Ana, aquela colega que trabalhou com a gente lá na sede do Centro, no ano passado?
- Sei, o que tem ela?
- Pediu demissão. Diz que vai ficar em casa porque quer acompanhar o crescimento dos filhos, pelo menos nos primeiros anos.
- Ah, coitada. Que judiação! Tão inteligente, podia ter um belo futuro!
- Só pode ser o marido que exigiu que ela virasse dona de casa. Estudou tanto pra nada…
 
- Menina, você nem sabe o que eu descobri.
- Conta logo.
- Lembra do Maurício, meu vizinho no prédio velho?
- Aquele lindo, com covinha no queixo? Nossa, que h-o-m-e-m é aquele????
- Pois então. Não é.
- Como assim?
- Fiquei sabendo que ele está morando com outro cara, vê se pode.
-Ah, não acredito! Que desperdício! Deveria haver uma lei que impedisse os caras bonitos de serem gays. Com tanta falta de homem no mercado…
 

- Tenho uma boa pra te contar. Lembra da Fátima, que morava no 303?
- Aquela gorda?
- Essa mesma. Ela tá frequentando a minha academia.
- Que bom, quem sabe assim emagrece um pouquinho.
- Mas você precisava ver o jeito dela. Acredita que ela vai de calça legging branca e camiseta justinha? Dá pra ver todos os buraquinhos de celulite que ela tem nas coxas.
- Credo, que horror. Tem gente que não se toca mesmo.

- Hoje a Alzirinha me apresentou o novo namorado. Você precisava ver.
- O que foi?
- Parece filho dela. Muito mais novo, e bem bonitinho.
- Ah é, e o que será que ele viu nela?
- Vai se saber! Deve ser o dinheiro. Só pode!
- Se eu tivesse a grana dela também arrumava namorado novinho…
 

Quatro historinhas verdadeiras. O que elas têm em comum? Todas ressaltam algum tipo de preconceito – aquele mesmo que, quando alguém toca no assunto, a primeira coisa que a gente diz é “graças a Deus eu não sou preconceituoso…”. Ah, somos. Uns mais, outros menos. Queremos não ser, é verdade. Sabemos que todos têm direitos iguais – o feio, o bonito, o gordo, o magro, o heterossexual, o homossexual, o deficiente, o sem deficiência, o velho, o jovem, a criança, o pobre, o rico, o remediado. Mas entre o saber e o agir há uma grande diferença. Ainda temos muito o que evoluir."

Viviane Bevilacqua

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