Arte de Yuri Yarosh
Segundo Freud, a nossa mente é
como uma casa em que vivem três habitantes. No térreo, mora um sujeito simples
e meio atucanado, chamado Ego. Ele não é propriamente o dono da casa, mas
cabe-lhe pagar a luz, a água, o IPTU, além de varrer o chão, lavar a roupa e
cozinhar. Estas tarefas fazendo parte da vida cotidiana, Ego até não se queixaria.
O pior é ter de conviver com os outros dois moradores.
No andar
superior, decorado em estilo austero, com estátuas de grandes vultos da
humanidade e prateleiras cheias de livros sobre leis e moral, vive um irascível
senhor, chamado Superego. Aposentado – aos pregadores de moral não resta muito
a fazer em nosso mundo – Superego dedica todos os esforços a uma única causa:
controlar o pobre Ego. Quando liga, se lembra de alguma piada boa e ri, ou
quando o Ego se atreve a cantar um sambinha, Superego bate no chão com o cetro
que carrega sempre, exigindo silêncio. Se Ego resolve trazer para casa uma
namorada ou mesmo uns amigos, Superego, de sua janela, advjerte: não quer
festinhas no domicílio.
No porão,
sujíssimo, mora o terceiro habitante da casa, um troglodita conhecido como Id.
Id não tem modos, não tem cultura e na verdade mal sabe falar. Em matéria de
sexo, porém, tem um apetite invejável. Superego, que detesta estas coisas,
exige que o Ego mantenha a incoveniente criatura sempre presa. E é o que
acontece durante todo ano.
No Carnaval,
porém, Id se solta. Arromba a porta do porão, salta para fora e vai para a
folia, arrastando consigo o perplexo Ego que, num primeiro momento, resiste,
mas depois acaba aderindo. E aí são três dias de samba, bebida, mulheres.
Quando volta
para casa, na quarta-feira, a primeira pessoa que vê Ego é o Superego,
olhando-o fixo da janela do andar superior. Ele não precisa dizer nada, Ego
sabe que errou. Humilde, enfia-se em casa, abre a porta do porão, para que o
saciado Id retorne a seu reduto, e aí começa a penitência, que durará
exatamente um ano.
De vez em
quando, Ego tem um sonho. Ele sonha que os três fazem parte de um mesmo bloco
carnavalesco, e que, juntos, se divertem a valer – o Superego é, inclusive, o
folião mais animado. Mas, isto é, naturalmente, sonho.
Moacir
Sciliar
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