terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Devo confessar que os cães entraram muito tarde em minha vida




Trecho da crônica “Redescobrindo o amor dos cães”, de Affonso Romano de Sant’Anna

Devo confessar que os cães entraram muito tarde em minha vida. Antes olhava-os com distante complacência. Não os hostilizava, mas também não sucumbia à sua sedução. Mas as coisas começaram a mudar há algum tempo. Talvez seja aquela coisa da sabedoria popular que diz que, quanto mais a gente conhece os humanos, mais gosta dos animais. Agora, por exemplo, nesse exato momento, uma linda yorkshire com nome de fada escocesa – Pixie, veio enroscar-se nos meus pés, enroscar-se nas frases deste texto.

Da infância, além dos cães da vizinhança, ficou-me na memória apenas aquele cão Veludo, num poema que a gente, entre lágrimas, ouvia nos concursos de declamação: “Eu tive um cão, chamava-se Veludo./ Magro, asqueroso, revoltante, imundo/Para dizer numa palavra tudo/Foi o mais feio cão que houve no mundo”. Não me lembro quem era o autor e espero que algum leitor daquele tempo em que a “escola era risonha e franca” me mande a cópia do mesmo. Mas o que interessa é que o poema contava de maneira patética como aquele cão feíssimo abandonado por alguém na hora da partida deu provas de amor ao dono até a morte.


(...) entre as conseqüências de ter cães, está a ressocialização dos humanos. Exato. Os animais ajudam os humanos a se ressocializarem. Vejo isto aqui pelas calçadas de Ipanema e Leblon. Como os proprietários de cães se param nas ruas e de alguma maneira também se cheiram socialmente, havendo casos, não poucos, de acasalamentos também de donos. E falam de seus cães como se falassem de filhos e netos. Talvez até com mais carinho. Pois os animais, embora tenham a tendência de assimilar características de seus donos, são menos exigentes e, em muitos casos, mais gratificantes que os humanos.

A comunidade dos que amam cães tem algumas características próprias. É possível que sejam semelhantes à irmandade dos que amam cavalos, gatos...e pessoas. São nichos de afeto dentro da vida. Já foi constatado que o contato físico com alguns animais melhora nossa saúde. Acho que muitas pessoas teriam uma cura psicanalítica mais barata se adotassem certos tipos de cães, mesmo porque eles se parecem com os psicanalistas, não falam, e podem nos fazer companhia mais do que uma sessão de 50 minutos.

Assim como há colecionadores de selos e esperantistas, os proprietários de cães constituem um mundo à parte, e, sendo em maior número que aqueles, na verdade, pode-se dizer que eles são propriedades de seus cães. Tive disto a prova real quando, telefonando para uma clínica de cães para marcar mais uma vacina, ouvi a moça do lado de lá me perguntar, quando disse o meu nome:
-Affonso, de que cachorro?.



Neste Natal, comprei o livro "tempo de delicadeza" de Affonso Romano de Sant´Anna, para me fazer companhia numa viagem de ônibus entre RS e SC.
Como sempre minha leitura se faz de trás para a frente. Sei lá porque, acredito que os últimos serão os primeiros...Fazer o quê? maluquices enraizadas...

Quando li essa crônica,lembrei imediatamente da minha história:
-"Devo confessar que os cães entraram muito tarde em minha vida'

Para mim cachorro era cachorro e hoje sem filhos em casa, minha Zuka é minha Zuka, minha maluca, minha descarga de afeto...coisa mais querida...

Meus filhos chegaram para o Natal e um deles trouxe uma cadelinha chamada de VICK ,[minha neta], que veio me deixar maluquete, pois quando me dei por conta eram elas, as cadelinhas, tia e sobrinha , as donas do assunto, do tempo, das conversas, das risadas e dos ciúmes do outro filho que tinha deixado em casa o Zig, o mais novo cachorro, que desabrigado foi acolhido depois das enchentes em Blumenau...

"entre as conseqüências de ter cães, está a ressocialização dos humanos. Exato. Os animais ajudam os humanos a se ressocializarem."

E confirmando o fato, depois de muita curtição com esses serezinhos maravilhosos,Ziggy foi adotado.

Agora o tempo vai ficar limitado para contar as peripércias de cada um.

Quanto ao "Acho que muitas pessoas teriam uma cura psicanalítica", vai deixar o Vinicius raivoso.

-Vinicius? de que cachorro?
-Do Ziggy, é que ele está tentando mestrado em psicanálise...

3 comentários:

Vinicius disse...

Muito bom o teu texto.
cachorros mexem com a gente, assim como mexemos com eles, no final, ninguém mais sabe de quem precisa mais do outro.
é uma ajuda mutua, longe da dinâmica analítica, mas perto da importancia. Cachorros tem sim um lugar no nosso psiquico muito importante.
O Ziggy, revolucionou e revoltou a casa e seu morador.
beijos

Unknown disse...

Adorei o texto sobre os cachorros, eu sou suspeita para falar, afinal tenho 4 e mais um afilhado aqui em casa passando as férias.
Mas sem os bichinhos nossa vida fica mesmo mais chata e vazia.
Beijo Martha.

Simone.sissagyn disse...

Martha!!! Que felicidade esse seu texto!!! O poema citado na crônica do cachorro Veludo, meu pai recitava para mim e meus irmãos quando pequenos... gente quanta lembrança boa!!! Obrigada. Bjs.