segunda-feira, 13 de abril de 2009

Para mudar, é preciso dar o primeiro passo



Divã,de Martha Medeiros, livro com mais de 60 mil exemplares vendidos se tornou no teatro uma peça que ficou três anos em cartaz e foi vista por 175 mil pessoas. Agora a atriz Lilia Cabral revive, no cinema, Mercedes,a protagonista. As mulheres se reconhecem na Mercedes.

Numa entrevista dada por Lilia Cabral ela conta que vê a Mercedes como uma mulher que pensava que estava vivendo – tinha vinte anos de casada, era professora, gostava de pintar, o marido era advogado... Mas a partir do momento em que ela começou a falar, ela foi se conhecendo. E com isso ela viu que não estava vivendo. Ou melhor: ela estava vivendo, mas ela não era feliz. E o fato de você buscar uma felicidade não significa que você vai de encontro à felicidade.


A comédia de José Alvarenga Jr inspirada no livro de Martha Medeiros, trás a tona a vida de uma mulher definida por “moderna, inteligente, pragmática, divertida e super-feminina”. Aos quarenta anos com uma vida que parece ser realizada, por curiosidade e brincadeira Mercedes procura um analista. Um profissional feito esse é capaz de fazer uma mulher centrada e estável refletir sobre sua própria vida e questioná-la, discutindo os padrões que não são colocados em pauta na rotina.


Parece simples que “Para mudar, é preciso dar o primeiro passo”. Mas por vezes as pessoas não se dão conta disso. E divã,convida para refletir




Cresça e divirta-se


Tenho viajado pra lá e pra cá acompanhando algumas pré-estreias do filme Divã, baseado no meu livro homônimo. Delícia de tarefa, ainda mais quando a gente gosta de verdade do trabalho realizado, e esse filme realmente ficou enxuto, delicado e emocionante. Além disso, ainda consegue me provocar. A personagem Mercedes (vivida pela incrível Lilia Cabral) está fazendo análise e leva pro consultório muitos questionamentos sobre sua vida. Até que, passado um tempo, finalmente relaxa e se dá conta de que não há outra saída a não ser conviver com suas irrealizações. Diante disso, o analista sugere alta, no que ela rebate: “Alta? Logo agora que estou me divertindo?”

Eu tinha esquecido dessa parte do livro, e quando vi no filme, me pareceu tão cristalino: um dos sintomas do amadurecimento é justamente o resgate da nossa jovialidade, só que não a jovialidade do corpo, que isso só se consegue até certo ponto, mas a jovialidade do espírito, tão mais prioritária. Você é adulto mesmo? Então pare de reclamar, pare de buscar o impossível, pare de exigir perfeição de si mesmo, pare de querer encontrar lógica pra tudo, pare de contabilizar prós e contras, pare de julgar os outros, pare de tentar manter sua vida sob rígido controle. Simplesmente, divirta-se.


Não que seja fácil. Enquanto um corpo sarado se obtém com exercício, musculação, dieta e discernimento quanto aos hábitos cotidianos, a leveza de espírito requer justamente o contrário: a liberação das correntes. A aventura do não-domínio. Permitir-se o erro. Não se sacrificar em demasia, já que estamos todos caminhando rumo a um mesmo destino, que não é nada espetacular. É preciso perceber a hora de tirar o pé do acelerador, afinal, quem quer cruzar a linha de chegada? Mil vezes curtir a travessia.

Dia desses recebi o e-mail de uma mulher revoltada, baixo astral, carente de frescor, e fiquei imaginando como deve ser difícil viver sem abstração e sem ver graça na vida, enclausurada na dor. Ela não estava me xingando pessoalmente, e sim manifestando sua contrariedade em relação ao universo, apenas isso: odiava o mundo. Não a conheço, pode sofrer de depressão, ter um problema sério, sei lá. Mas há pessoas que apresentam quadro depressivo e ainda assim não perdem o humor nem que queiram: tiveram a sorte de nascer com esse refinado instinto de sobrevivência.

Dores, cada um tem as suas. Mas o que nos faz cultivá-las por décadas? Creio que nos apegamos com desespero a elas por não ter o que colocar no lugar, caso a dor se vá. E então se fica ruminando, alimentando a própria “má sorte”, num processo de vitimização que chega ao nível do absurdo. Por que fazemos isso conosco?

Amadurecer talvez seja descobrir que sofrer algumas perdas é inevitável, mas que não precisamos nos agarrar à dor para justificar nossa existência.

Martha Medeiros
4/04/2009

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