Arte de Irene Sheri Vishnevskaya
"Sim,
a vida seria bem mais simples e espontânea se as pessoas não vomitassem
felicidade falsa nem tentassem o tempo todo provar um equilíbrio que elas não
têm. Ninguém acorda super bem todos os dias. Ninguém se sente disposto para uma
cerveja depois do expediente todos os dias. Ás vezes a gente fica mal mesmo,
lembra de um monte de fatos trash e quer chorar na cama que é lugar quente. Ás
vezes as coisas não parecem fazer muito sentido e a gente quer ficar fechadinho
dentro da gente mesmo.
A
gente não é obrigado a ficar feliz e comemorar porque é Natal, réveillon ou dia
dos namorados. A gente não precisa necessariamente sorrir e querer curtir
porque faz sol, porque a gente está na praia ou porque disseram que a vida é
simples e é o ser humano que complica.
A
gente não precisa rejeitar a tristeza como se fosse uma doença pestilenta. Ela
faz parte da vida como a alegria. Só precisamos tomar cuidado para não transformá-la
em um hábito ou nos esconder atrás dela por medo de ser feliz ou ainda dar
importância demais a problemas e principalmente à pessoas pequenas. Este é um
exercício e tanto que pode levar anos ou a vida inteira. Mas me parece que vale
a pena.
A
vida seria mais simples se as pessoas fossem mais elas mesmas. Se elas olhassem
nos olhos dos outros e falassem sobre seus problemas, seus medos. A vida seria
mais simples se a gente não precisasse provar que é bem-sucedido o tempo todo.
Seria mais simples se a gente pudesse gostar das pessoas independentemente da
vida que elas levam. Se a gente pudesse dizer sem constrangimento algum que
está se sentindo um monte de merda e que a vida pode ser bem complicada sim.
Talvez, se admitíssemos mais o caos que é viver, não sofreríamos tanto. Talvez,
se desfocássemos mais daquilo que dizem que é importante , mas que não faz
sentido para nós, fôssemos mais bem sucedidos num sentido mais amplo.
Talvez
se mostrássemos mais os nossos rostos demaquilados e nossas almas nuas, se não
nos defendêssemos tanto uns dos outros, se não nos importássemos tanto em
mostrar que somos melhores do que os outros, pudéssemos ser mais unidos, mais
solidários, mais amados, mais amantes.
Se
a gente entendesse que todo mundo está no mesmo barco...Rogo pelo dia em que as
mulheres casadas se assumam sozinhas e mal amadas. Rogo pelo dia em que as
mulheres solteiras confessem que uma companhia faz falta sim e que fazer tudo
sozinha pode ser muito triste. Rogo pelo dia em que os homens tanto casados como
solteiros afirmem com todas as letras que morrem de medo das mulheres e que
nunca deixam de ser meninões. Rogo pelo dia em que as mães gritem desesperadas
o quanto estão cansadas e as que não têm filhos lamentem esta lacuna em suas
vidas. Que os crentes reclamem dos grilhões da fé e que os ateus lamentem não
crer. Que todos se assumam meio perdidos, meio sozinhos nesta vida louca. Rogo
para que as pessoas assumam como o passado é doloroso e o futuro incerto. E
depois de tantas confissões acaloradas, que elas possam respirar fundo, sorrir
umas para as outra e seguir em frente cheias de coragem. Que depois de tudo, a
gente pudesse cantar juntos I will survive e nos sentir intimamente ligados ao
outro por meio da nossa vulnerabilidade, por meio da nossa capacidade
irrestrita e desgovernada de dar e receber amor."
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