Arte de Yana Fefelova
"Meus pais têm um vocabulário
próprio: matar o cachorro a grito, chorumela, nem que a vaca tussa, onde fui
amarrar meu bode, chispa daqui, é dose para elefante, firme na paçoca.
(...) Sem perceber, acabei herdando
uma das expressões. Incorporei uma das antiguidades familiares. Veio comigo e
continua comigo.
Sobreviveu ao meu preconceito e minha ânsia de ser atual.
É a palavra pousar para dormir.
– Pousará fora?
– Onde vai pousar?
– Ninguém pousará em casa, estaremos viajando.
– Pousará fora?
– Onde vai pousar?
– Ninguém pousará em casa, estaremos viajando.
Acho que pousar é melhor do que
dormir mesmo.
Tem mais sentido para mim.
Pousar também representa quando o sexo é amor.
Pousar é romântico. Pousar é renunciar o céu por um lugar definitivo. Pousar é aceitar que não podemos passar a vida ao vento. Pousar é descansar de longa viagem.
Pousar é tranquilidade, é mansidão, combina com ficar de conchinha, deitar de pés dados, cheirar o cangote.
Pousar é uma atitude que supera o descanso. É confiança. É se doar. É se decidir por um canto seguro e acolhedor. É se enraizar numa árvore.
Eu me imagino descendo do turbilhão dos acontecimentos, diminuindo o ritmo, distanciando-me da pressão do trabalho. E vou me acostumando com o silêncio, com a intimidade, com o travesseiro de penas.
Quando amo, não durmo com alguém, eu pouso com alguém.
Paro de voar. Desisto da altura pelo chão. A casa é ninho.
Quando amo, sou pássaro. Deixo de sofrer como homem."
Fabrício Carpinejar
Nenhum comentário:
Postar um comentário